UMA IMAGEM DO PASSADO


            Eu tinha doze ou treze anos quando, andando de bicicleta pela parte mais baixa de meu bairro de infância, próximo à rodovia Raposo Tavares, avistei uma mulher de cabelos longos e brancos, trajando um longo vestido de pregas que ia até o chão, e com aparência muito pobre.
            Ela estava andando e parou no canteiro que havia entre a rodovia e uma rua do bairro. Sem agachar-se, levantou um pouco o vestido para fazer alguma necessidade. Ao ver aquela cena, fiqui chocado e escandalizado, não pelo que aquela senhora estava fazendo, mas pela pobreza da mulher, que a obrigava a um ato que julguei tão indigno para uma senhora daquela idade.
            Dei meia volta, pedalando rapidamente até a minha casa, onde peguei algum dinheiro, e voltei ao local onde eu havia visto aquela pobre senhora.
            Mas ela não estava mais ali. Pedalei por todo o bairro e não a encontrei em lugar algum. Voltei para casa cheio de compaixão, lamentando não ter podido ajudá-la e pensando como seria a sua vida.
            Vão-se, desde então, cerca de quarenta e cinco anos, e mesmo assim, após essas décadas, a imagem daquela idosa me acompanha. Quero crer que seja porque em meu peito ainda bate um pouquinho daquele coração inocente de criança, que a vida foi, aos poucos, endurecendo.
            Enquanto essa imagem me acompanhar, eu ainda terei salvação; mas quando eu a esquecer, terei perdido completamente a minha humanidade.

Nenhum comentário: