“E JESUS CHOROU” (Jo 11,35)

No final de julho de 2005, a Diocese de Nova Iguaçu, na qual estou incardinado, foi abalada pelo assassinato do Padre Paulo Keler Machado. Assim como para todos, sua morte foi um choque para mim; no entanto, é fato que não chorei ante esta violência contra o meu irmão no ministério presbiteral. Lembro-me, porém, que durante a procissão de entrada da missa de corpo presente, celebrada no espaço comunitário da Igreja da Sagrada Família, da Posse, ao sentir a dor e a emoção da multidão que ali se encontrava, fiquei profundamente comovido. E chorei. No Evangelho do último domingo, o 5.o da Quaresma deste Ano A – Jo 11, 1-45: a morte de Lázaro – lemos no versículo 35 que Jesus chorou. O texto nos dá algumas informações que nos preparam para o sinal que Jesus irá realizar, qual seja, a revivificação de seu amigo Lázaro: “Lázaro está morto. Mas por causa de vós, alegro-me por não ter estado lá, para que creiais.” (Jo 11, 14b-15); antes, ainda, lemos: “Essa doença não leva à morte; ela serve para a glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela” (Jo 11,4); já em Betânia, Jesus afirma a Marta, irmã de Lázaro: “Teu irmão ressuscitará” (Jo 11, 23b) e “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim não morrerá jamais.” (Jo 11, 25b-26). Jesus sabe o que e o porque irá fazer – trazer Lázaro de volta à vida. Entretanto, no versículo 35 lê-se: “E Jesus chorou.” Estas lágrimas de Jesus muitas vezes nos surpreendem e somos tentados a unir nossa voz à daqueles judeus sem fé no Messias: "Este que abriu os olhos ao cego, não podia ter feito com que Lázaro não morresse?” (Jo 11, 37b). E ainda acrescentar a estas vozes: “Por que desse choro se Ele sabe que vai trazer Lázaro de volta à vida?” Recordando a minha emoção ante a emoção do povo na missa exequial do Pe. Paulo em 2005 e atentando para o contexto apresentado pelo Evangelho, compreendi as lágrimas de Cristo: “Quando Jesus a (Maria) viu chorar, e também os que estavam com ela, estremeceu interiormente, ficou profundamente comovido e perguntou: ‘Onde o colocastes?’ Responderam: ‘Vem ver, Senhor’. E Jesus chorou.” (Jo 11, 33-35). No prefácio próprio para o Evangelho de Lázaro, encontramos esta belíssima interpretação: “Ele, homem verdadeiro, chorou o seu amigo Lázaro, e, Deus eterno, fê-lo sair do túmulo. Assim também, compadecendo-se da humanidade, levou-nos, pelos sagrados mistérios, a uma vida nova”. Eis, pois, de maneira tão clara e objetiva, a explicação para as lágrimas de Cristo Jesus: a compaixão. Diversas vezes, os Evangelhos dizem que Jesus sentiu compaixão – paixão com, sofrer com, sentir o que o outro sente. Na sua humanidade, Jesus expressa uma característica de sua divindade, a compaixão. E nós, imagem e semelhança de Deus, devemos procurar ter em nós as qualidades de Quem fomos criados à imagem e semelhança. Deus é amor? Sejamos, pois, nós também amor. Deus é perdão? Sejamos perdão. Deus é misericordioso? Sejamos igualmente. Deus é bom? Hajamos também nós na gratuidade. Deus é compassivo? Da mesma forma o sejamos. “Tenham em vós os mesmos sentimentos que havia em Jesus Cristo” (Fl 2,5). Todas as vezes que a Sagrada Escritura afirma que Jesus sentiu compaixão, segue-se um gesto concreto Dele em favor do necessitado (Mt 14,14; 15, 29-39; 20,29-34; Lc 7, 11-17; 17, 11-19; e outros textos que apresentam a imagem de Deus, como nas parábolas do Pai misericordioso e do bom samaritano, para citar alguns). Daí a importância de termos em nós os mesmos sentimentos que havia em Jesus Cristo, como nos exorta o Apóstolo. Se tivermos compaixão do próximo, se sentirmos em nós o que ele sente, jamais deixaremos para depois o que precisa ser feito agora para ao menos minimizar a dor e o sofrimento alheios. Uma breve reflexão quaresmal para levar-nos a atos concretos imediatos em favor do próximo no tempo comum da nossa existência para vivermos uma eterna páscoa.

Nenhum comentário: