FAZENDO A EXPERIÊNCIA DO RESSUSCITADO HOJE



Desde a Vigília Pascal até o 2.o Domingo da Páscoa, passando por todos os dias da Oitava da Páscoa, os Evangelhos nos falaram das diversas aparições de Jesus Ressuscitados a seus apóstolos e discípulos, em diferentes momentos e situações. Muitos cristãos com certeza, lendo essas passagens, pensam como seria maravilhoso estar naquela época e naquele lugar em que o Ressuscitado se manifestou a tantos. No entanto, a mesma experiência do Ressuscitado, que aquelas pessoas fizeram há quase 2 mil anos, está ainda dentro de nossas possibilidades e constitui parte indispensável para a nossa vivência de fé e de comunidade. Se ainda está dentro de nossas possibilidades, como reconhecer o Cristo Ressuscitado hoje?
As narrativas das aparições de Jesus e da mensagem dos anjos, encontradas nas leituras pascais, se lidas não de forma fundamentalista, mas interpretadas teologicamente, são chaves para encontrarmos Jesus hoje e reconhecê-lo.
9) A mensagem do anjo (Mt 28, 1-8): nesta passagem, o Anjo informa que Jesus pode ser encontrado na Galiléia. Por que na Galiléia? Porque, segundo os Evangelhos Sinóticos, a vida pública de Jesus, isto é, a sua pregação e os milagres que operou, deram-se na Galiléia. Portanto, onde a palavra de Deus é semeada, ali estará Jesus, ali O encontraremos.
2) Aparição às santas mulheres (Mt 28, 9-10): assim como na mensagem do Anjo, esta passagem nos mostra que Jesus pode ser encontrado onde o Evangelho é anunciado.
3) Aparição na Galiléia (Mt 28, 16-20): nas duas passagens anteriores e no princípio desta, vemos que Jesus pode ser encontrado onde o Evangelho já foi anunciado. Nesta passagem, porém, encontramos elementos novos: Jesus estabelece uma missão aos Onze, que é a de fazer de todos os seres humanos discípulos d’Ele, ensinando a colocar em prática os Seus ensinamentos. Dessa forma, encontramos Jesus na missão evangelizadora e onde seus ensinamentos são praticados.
4) Aparições de Jesus Ressuscitado (Mc 16,9-20): esta passagem narra diversas aparições de Jesus: a Maria Madalena, a dois discípulos que caminhavam para o campo e aos Onze. Aqui, além de elementos já apresentados anteriormente, temos um novo: a fé. Para encontrarmos Jesus é necessário acreditarmos no testemunho daqueles que já O encontraram.
5) Os dois discípulos de Emaús (Lc 24, 13-35): uma das mais famosas e importantes narrativas das aparições de Jesus, a passagem dos discípulos de Emaús apresenta-os indo embora de Jerusalém, desiludidos com o desfecho da história daquele que eles consideravam como sendo o Messias. Enquanto caminham, Jesus põe-se no meio deles e, ante a falta de fé de ambos, explica-lhes todas as passagens do Antigo Testamento à luz de Sua vida. Esta passagem nos ensina que Jesus está conosco quando o invocamos, quando o convidamos a permanecer conosco, mesmo que não o percebamos, como aconteceu com os discípulos de Emaús. Mas o aspecto mais importante desta passagem é o eucarístico: Jesus se dá a conhecer na Eucaristia. Ao desaparecer na frente dos dois discípulos, o Ressuscitado ensina que aquele Jesus de Nazaré pode ser encontrado e se revela na mesa eucarística.
6) Jesus aparece aos apóstolos (Lc 24, 36-42): esta passagem nos ensina que a presença de Cristo no meio de nós é real e verdadeira. Mostra-nos, ainda, que mesmo com nossas perturbações e dúvidas, Jesus se faz presente em nosso meio; portanto, sem o merecermos, mas por pura gratuidade, para trazer-nos paz e alegria ao coração.
7) Aparição a Maria Madalena (Jo 20,11-18): talvez a mais emocionante e poética das narrativas da Ressurreição, é um modelo literário de concisão aliada à força dramática. Jesus manifesta-se a Maria Madalena pelo chamamento. Jesus conhece cada um de nós – também discípulos – pelo nome e nos chama, dando-se a conhecer. A vocação e o envio à missão (naturalmente com a nossa resposta positiva) são uma das formas que temos de encontrar Jesus.
8) Aparição aos discípulos (Jo 20, 19-29): esta passagem é rica em imagens. Jesus se dá a conhecer quando estamos reunidos em assembléia, o que nos faz lembrar de Mt 18,20: “Pois onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles”. Não só está presente, como proporciona paz e alegria aos corações. Assim, estes estados de espírito são sinais, são conseqüências da presença de Cristo em uma comunidade. Na parte em que Jesus se dirige a Tomé, as chagas mostradas a este ao mesmo tempo em que representam o sinal máximo de Seu amor, representam a rejeição do Reino pela humanidade. Assim, eu encontro Jesus em todos os rejeitados e excluídos pela sociedade. “Em verdade vos digo: cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25,40). Contemplando Jesus crucificado, reconheço-o em sua rejeição pelo mundo, mas sou incapaz de reconhecê-lo nos mais necessitados. “Porque viste, creste. Felizes os que não viram e creram!”
9) Aparição à margem do lago de Tiberíades (Jo 21,1-23): Jesus é reconhecido na superabundância de peixes, que lembra as bodas de Caná. Esta superabundância expressa a graça de Deus e a vinda de Seu Reino. Assim, encontramos Jesus nas graças que recebemos diariamente, em nosso cotidiano, mas nem sempre o reconhecemos. Mais adiante, no texto, a partilha do peixe e do pão ensina-nos que na partilha do que temos, do fruto do nosso trabalho e do que temos em excesso, Jesus está presente.

“Interrogado pelos fariseus sobre quando chegaria o Reino de Deus, respondeu-lhes [Jesus]: ‘A vinda do Reino de Deus não é observável. Não poderás dizer: Ei-lo aqui! Ei-lo ali!, pois eis que o Reino de Deus está no meio de vós’” (Lc 17, 20-21).
Estamos esperando um retorno espetacular, extraordinário, a nova vinda de Jesus para, enfim, realizar-se o Reino de Deus. No entanto, o Evangelho é claro ao nos ensinar que o Reino de Deus já está acontecendo em cada pequeno ato que fazemos, no qual colocamos em prática os ensinamentos de Jesus. Jesus está no meio de nós e não o reconhecemos, e invejamos aquelas pessoas que, há séculos atrás, tiveram a experiência do Cristo Ressuscitado. De acordo com as diversas aparições de Jesus após a Ressurreição, podemos encontrá-Lo e reconhecê-Lo: na gratuidade divina; através da nossa experiência de fé; na missão evangelizadora na qual a Palavra de Deus é pregada e testemunhada; na Eucaristia; na vocação de cada um; na invocação que fazemos de Jesus; na vida em comunidade; no cotidiano de nossas vidas; na partilha do que temos.
Em todas essas situações e em cada uma particularmente, o ponto em comum não é apenas Jesus, mas, acima de tudo, a minha resposta (a nossa resposta), o meu “sim” (o nosso “sim”) à proposta de Reino que Deus faz. Deus quer se revelar e agir no meio de nós, mas conta comigo, conta com cada ser humano.
Portanto, todos nós, e cada um individualmente, somos responsáveis pelo Reino de Deus no aqui e no agora de nossas vidas. Quem ousa excluir-se dessa responsabilidade?
março-abril de 2002

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