O primeiro aspecto em relação ao pecado original a ser realçado é o da própria expressão “pecado original”. Com certeza não é uma boa expressão, pois tende a tornar o pecado o ponto central de uma discussão que deveria ter a graça salvífica de Deus como centro. Portanto, o elemento determinante na reflexão cristã deve ser a Graça, e não o pecado, sendo o anúncio deste feito em vista e no interior daquela. É a graça que nos faz descobrir o mistério do pecado e não o contrário: na raiz da possível recusa do ser humano à interpelação de Deus está o que se costuma chamar de “pecado original”.
Como surgiu essa situação de não-salvação não se sabe. A tradição judaico-cristã, através de uma construção literária etiológica, encontrada em Gn 3, atribui ao primeiro homem e à primeira mulher, Adão e Eva, uma desobediência a Deus, a qual se transmite a toda a humanidade por propagação e não por imitação. Paulo, na Carta ao Romanos, retoma a passagem do livro do Gênesis sobre Adão e Eva, reafirmando que o pecado de Adão não afetou apenas a ele, mas a toda sua descendência, acrescentando que o único remédio para esse mal é Jesus Cristo.
Explicando a maneira como o pecado de Adão tornou-se o pecado de todos os seus descendentes, a Igreja, em seu Catecismo, afirma que tal se deu em virtude da unidade do gênero humano (sicut unum corpus unius hominis – como um só corpo de um só homem): todos os homens estão implicados no pecado de Adão, assim como todos os estão na justiça de Jesus Cristo. Mesmo esta explicação não permite compreender plenamente o mistério do pecado original.
Santo Agostinho, frente aos pelagianos, que subestimavam a força do pecado, é quem introduz a expressão “pecado original”, insistindo fortemente na realidade do pecado em cada homem. Ao dar tanta ênfase ao pecado, Agostinho esqueceu-se do primado de Cristo, vendo uma união da humanidade em Adão anterior à união em Cristo, ou seja, a humanidade estaria primeiramente encerrada no pecado para, depois, ser libertada por Cristo.
Em suma, ao falarmos de pecado original, estamos falando de uma situação de não-salvação, anterior a toda decisão pessoal e comum a todos os seres humanos, situação essa que só pode ser superada pela união a Jesus Cristo. Como se chegou a essa situação não se sabe, mas ela é uma realidade manifesta não em teorias abstratas e especulativas, mas no cotidiano da existência de cada ser humano.
outubro de 2001
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